sexta-feira, 27 de novembro de 2009

O que é um "clássico"?




Ao projetar a presente página sempre imaginei um espaço para poder falar de confrontos clássicos, sejam eles os chamados derbys ou simplesmente clássicos mesmo. Mas logo vem a pergunta: o que é um confronto clássico?

Recentemente um cronista do meu Estado (Goiás) falou que um grande clássico do meu Estado deixaria de ser clássico porque um dos times estaria na segunda divisão do certame nacional e que, o grande clássico do Estado mudaria, seria outro.

Eu pergunto: acaso clássico é algo tão transitório assim? Se for pode ser considerado clássico? Um clássico depende da posição em que está para ser clássico? É em busca de respostas para tais perguntas que irei no presente momento.

Ao tentar responder as indagações apontadas acima não sei se o faço levando em consideração meus anos na faculdade de História ou minhas décadas de estádios e jogos pela TV e rádio. Sim, creio que a segunda opção é a mais plausível, se bem que os anos do curso de História (bons anos por sinal) me trouxeram um inestimável conhecimento sobre futebol, já que as conversas sobre “bola” nos banquinhos da antiga FCHF em muito me valeram.

Mas, ao falar de clássico do futebol logo me vem um questionamento sobre o que é de fato um clássico e, se algo para se tornar clássico tem automaticamente que tomar o lugar de outro, creio que não, afinal quando Richard Wagner expôs seu talento se transformando rapidamente em clássico não tomou o lugar de Beethoven (cito os dois por não conseguir decidir qual obra é mais explosiva: A Cavalgada das Valquírias ou a Nona Sinfonia).

Para um clássico existir não necessariamente deve tomar o lugar de outro, um clássico se faz na transição de gerações, se faz nas entranhas do imaginário de um povo.

Diferentemente do que alguns possam imaginar não devem existir graduações em clássicos, afinal, poderia eu perguntar: qual o maior clássico da literatura? Crime e Castigo (Dostoievski), El Ingenioso Hidalgo Don Quixote de La Mancha (Cervantes), A Divina Comédia (Dante), Os Miseráveis (Victor Hugo), Fausto (Goethe), Rei Lear (Shakespeare), Odisséia (Homero), Cien Años de Soledad (Garcia Marquéz), Guerra e Paz (Tolstói) ou tantos outros? Há quem discuta se Crime e Castigo é a maior obra de Dostoievski ou se Rei Lear é a “obra mais clássica” de Shakespeare. O que se sabe é que todas as obras e os respectivos autores supracitados são clássicos, o fato de um ser clássico não faz com que o outro não seja. Clássico é clássico sem que um seja mais clássico do que o outro.

No futebol não é diferente, vai dizer para um torcedor do Widad que Real Madrid e Barcelona é um clássico maior do que Widad x Raja Cassablanca, ou tente falar para um cidadão de Verona que Hellas Verona x Chievo Verona não é o maior clássico do futebol italiano.
Os grandes clássicos do futebol se constituem por razões diferentes, algumas mais fáceis de serem notadas e outras impossíveis. Vamos a algumas delas com exemplos clássicos de confrontos clássicos.

Um confronto entre duas equipes pode simbolizar uma disputa política, caso marcante é Real Madrid x Barcelona, não é segredo para ninguém que o Madrid se transformou no maior time do século XX com uma “ajudinha” do ditador Francisco Franco Dehamonde que ameaçava juízes, forçava resultados, perseguia jogadores do Barça e por fim, quando tudo isso não dava admitia a contragosto que o Barcelona era o legítimo campeão espanhol. Por outro lado, o Barcelona celebrava nos campos as vitórias que não podiam ser celebradas na política ou em campos de batalhas, expressando no futebol todo orgulho de ser catalão, em um clássico de 2004 no Camp Nou com 120 mil pessoas aparece a frase: “Catalunya no es España”.

Um exemplo de clássico que se notabilizou por causa de questões econômicas trazendo para o campo rixas extra campo é o clássico mor holandês Feyenoord x Ajax, sendo que o primeiro representa a antiga Holanda, os antigos aristocratas que comandaram o país antes do século XX, a Holanda do interior, dos caminhos das antigas feiras; e do outro lado o Ajax representa a nova Holanda, a Holanda dos judeus a Holanda dos modernos portos.

Dentro da temática da economia tem também o famoso os ricos contra os pobres, caso de Boca Juniors x River Plate, sendo o segundo conhecido como “los millionarios”, ou então Milan x Inter de Milão, sendo pasmem, os primeiros os pobres, ou então Anápolina x Anápolis, sendo o segundo chamado de “time de carroceiros” expressando sua origem humilde. Clássicos deste estilo existem mundo afora, poderíamos listar mais de uma dezena, mas cremos que estes representem bem o que queremos expressar no presente momento. O mais emblemático deles talvez seja Vasco da Gama x os outros times do Rio de Janeiro, mas se for assim poderíamos alegar questões raciais que fizeram com que o Vasco da Gama fosse odiado pelos outros times elitistas e embranquecidos do Rio de Janeiro, mas é melhor creditarmos a rivalidade apenas ao campo social, pois sendo assim teríamos que citar Grêmio x Inter, o primeiro segregacionalista até pouco tempo.

Existe também o clássico que junta as duas questões a política e a econômica, é o caso de Dinamo Kiiv e Shakhtar Donetsk, o primeiro representa a nova Ucrânia que quer fazer parte da União Européia, a Ucrânia moderna e competitiva, já o segundo representa a Ucrânia saudosista da URSS que crê que o petróleo é a solução para todos ao males e que não se vê como europeu, mas sim como eslavo-russo.

Um clássico pode ser grande também por transpor o campo religioso e chegar ao esportivo, como o caso do magnífico Celtic Rangers x Glasgow Rangers, sendo o primeiro representante da parte católica da Escócia e o segundo o representante dos protestantes escoceses.

Existem os chamados Derbys, clássicos dentro da mesma cidade, aí poderia citar muitos, pois são os mais comuns: Guarany x Ponte Preta, Remo x Paysandu, Santa Cruz x Sport Recife, Galatasaray x Fenerbaçe, Peñarol x Nacional, América x Deportivo Cali, Juventus x Torino, Manchester United x Manchester City, Vila Nova x Goiás, Atlas x Chivas Guadalajara, Slavia Praha x Sparta Praha, CSKA Moskva x Spartak Moskva, Dinamo Bucuresti x Steaua Bucuresti, Grasshoppers x FC Zürich , Everton x Liverpool, Estrela Vermelha x Partizan Belgrado, Arsenal x Tottenham, Sevilha x Real Betis, Independiente x Racing, Rosario Central x Newell’s Old Boys, Cerro Porteño x Olimpia, Olympiacos x Panatinaico, Al Ahly x Zamalek, Fortaleza x Ceará, Bahia x Vitória.

Neste quesito têm também os clássicos inter-bairros: Roma x Lazio, West Ham x Millwall, Fluminense x Botafogo. O futebol argentino é marcado por este tipo de clássico onde podemos destacar os clássicos inter-bairros de Buenos Aires: San Lorenzo x Huracán, que são de bairros vizinhos. Além do Clássico da Zona Oeste Vélez x Ferrocarril e o Clássico da Zona Sul Banfield x Lanús.

Existem também os clássicos de instituições diferentes como Universidad Católica x Universidad de Chile e Alianza Lima x Universitário.

Tem também clássicos entre times de cidades rivais, América x Necaxa, Porto x Benfica, Paris Saint-Germain x Olympique Marseille, Borussia Dortmund x Schalke 04, Olympique Lyon x Saint-Etienne, Borussia Dortmund x Bayern de Múnich, Standard de Lieja x Anderlecht, Urawa Reds x Gamba Osaka, Valência x Real Madrid.

Tem até clássicos por brigas familiares como é o caso de Genoa x Sampdoria, aconteceu que a venda de um ídolo do Genoa o jogador Maroni ao Torino provocou um trauma muitos torcedores que haviam arrecadado dinheiro para manter o craque se sentiram traídos. Um deles foi Paolo Mantovani, que em 1970 comprou o rival Sampdoria e o levou aos títulos da Copa da Itália, da Recopa Européia e do Italiano em 91, o detalhe é que Paolo era irmão de Marcelo Mantovani presidente do Genoa.

Como havia expressado antes, são vários os motivos que fazem com que um clássico surja, mas é um só que faz com que ele se eternize: o AMOR do torcedor por seu clube. Aqui vale a máxima “clássico não tem favorito” essa é uma das maiores verdades do futebol, pois clássico é realmente um jogo diferenciado.

Um clássico continuará sendo clássico passe o tempo que passar, mesmo um dos times estando na primeira divisão e o outro na quarta divisão como é o caso de Hellas Verona x Chievo Verona, sendo que o Hellas está na quarta divisão do Calcio. Podemos também citar o exemplo de Bahia x Ypiranga, o maior clássico do futebol baiano, sim o maior clássico do futebol baiano, aí alguém pode perguntar: quem é Ypiranga, a resposta é simples, é o maior rival do Bahia, mesmo o amarelinho e preto estando quase sumido dos estádios ainda é um clássico contra o Bahia. O Chivas continuará tendo o Atlas como seu maior rival, mesmo o Atlas não sendo campeão há 50 anos.

Um clássico nasce e jamais morre.

Clássicos continuam sendo clássicos por tudo o que o cercam, o Chivas pode ganhar todos os títulos possíveis, mas... O primeiro título do Jalisco será sempre do Atlas. O Chievo Verona pode ganhar 50 campeonatos italianos, mas... O primeiro time de Verona a ter ganho será sempre o Hellas Verona.

Um clássico existe por causa do AMOR e se sustenta pela rivalidade, um torcedor do Vila Nova prefere mil vezes golear o Goiás do que o Real Madrid ou o Milan, é a rivalidade que faz com que na camisa do Hellas Verona esteja escrito: “Un calcio non dominerà mai, partito con un sangue o la morte.”, se por acaso o Chievo ganhar, a inscrição continuará lá.

O Bahia pode ser campeão brasileiro, ter uma torcida respeitada e tudo mais, mas uma coisa jamais terá: os torcedores do Ypiranga. O Chivas pode ganhar tudo, mas jamais ganhará os torcedores do Atlas, nem tampouco os filhos destes ou os filhos dos filhos. O torcedor do Shalke 04 viu nos últimos 30 anos o Bayern se tornar o maior time alemão, mas não tem o desgosto de ver sua torcida deixar de ostentar o azul para vestir vermelho.

Um clássico é clássico porque o jogo contra o rival e tudo que o cerca constitui nas horas mais importantes da vida de qualquer torcedor, até chegar a hora do outro clássico e assim eternamente.

No futebol não é o poder aquisitivo dos times que fazem os clássicos, exemplo claro disso são as riaquissimas ligas dos Estados Unidos e do Qatar que não conseguem produzir nenhum clássico, quem sabe no futuro poderemos ver confrontos clássicos nesses países.

Clássicos são clássicos e serão eternamente, jovens continuarão a se emocionar com o Werther e se apaixonar pela Charlotte, homens de meia idade continuarão a se ambicionar como o Fausto frente aos Mefistófeles de suas próprias vidas, as pessoas continuarão a se angustiar como MacBeth ou como Raskólnikov e em determinados momentos se reconhecerão como um Karamazov ou como um Sancho Pança, e é por isso que os clássicos continuarão a ser clássicos.

No futebol da mesma forma, pode nascer ou morre um país, mas o clássico continuará a ser clásscio, como o caso do Estrela Vermelha x Partizan que já foram um clássico da Iugoslávia, Sérvia e Montenegro e agora é um clássico da Sérvia, ou então o Slávia Praga x Sparta Praga que independendo do campeonato nacional que dispute é um clássico, é só este sentimento que faz com que a Portuguesa Santista um time de bairro enfrente de igual pra igual o todo poderoso Santos, um dos maiores times da história do futebol.

São nos clássicos que um grande jogador prova que é craque, são nos clássicos que se separam os meninos dos homens e os homens dos deuses.

Assistimos os mesmos clássicos que os nossos pais assistiram, que outrora os pais deles viram, e nossos filhos e netos verão os mesmos clássicos, podem até verem outros, mas também contemplarão os que nós contemplamos.
CLÁSSICO É CLÁSSICO.

4 comentários:

  1. Parabéns pelo blog e principalmente por essa matéria, ficou muito boa. Clássico sempre sera clássico, não importa a divisão. VILA NOVA ♥

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  2. Makchuell, muito bom esse texto! Acho que clássico é isso mesmo, subjetivo. Pra mim,por exemplo, Santos x Atlético-Pr é clássico. Para o menino do interior do Amazonas, lá tem seus clássicos também que ninguém sabe. O infeliz comentarista de seu estado não sabe o que é clássico. Aliás, não ouço mais nenhum comentarista de meu estado. São muito fracos, não sabem de nada, nada! Ainda bem que terminei meu blog e no lugar nasceu o seu. A internet agradece!

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  3. Vila Nova , é isso ai tigrão éo .

    Um clássico existe por causa do AMOR e se sustenta pela rivalidade, um torcedor do Vila Nova prefere mil vezes golear o Goiás do que o Real Madrid ou o Milan

    VILA EU TE AMO .

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  4. Congratulazioni per il testo.Sono tifose del Corinthians e vincere el Palmeiras è infinitamente migliore di un Santos.Saluti de un tifose di Hellas Verona.Chievo è nulla!

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